A essencial intolerância do pensamento politicamente correto
Marc Vittelio
Mídia Sem Máscara - 27/04/2004
Entrevista de Vladimir Volkoff a Marc Vittelio.
Vladimir Volkoff é doutor em filosofia, professor de inglês, militar durante a guerra da Argélia, funcionário do Ministério da Defesa e, mais tarde, professor de línguas e literatura francesa e russa nos Estados Unidos. Foi o primeiro escritor que dedicou seriamente seus estudos na França à manipulação informativa. Parente de Tchaikovsky, é um dos escritores melhor situados na hora de explicar o conceito que conhecemos como “politicamente correto”, tema de seu último livro publicado pela Editions du Rocher: “La désinformation par l’image”. Nos encontramos com este autor que transpira humor e cultura por todos os seus poros e que nos prodigalizou alguns conselhos para combater esse veneno que ataca nossa sociedade.
- Qual é a sua definição do “politicamente correto”?
- O politicamente correto tal e como o conhecemos atualmente, representa a entropia do pensamento político. Como tal, é de impossível definição posto que carece de um verdadeiro conteúdo. Seu fundamento básico é aquele do “vale tudo”. Nele encontramos restos de um cristianismo degradado, de um socialismo reivindicativo, de um economicismo marxista e de um freudismo em permanente rebelião contra a moral do ego. Se compararmos a demolição do comunismo com uma explosão atômica, diríamos que o politicamente correto constitui a nuvem radioativa que acompanha a hecatombe.
- Em que consiste o “politicamente correto”?
- O politicamente correto consiste na observação da sociedade e da história em termos maniqueístas. O politicamente correto representa o bem e o politicamente incorreto representa o mal. O sumo bem consiste em buscar as opções e a tolerância nos demais, a menos que as opções do outro não sejam politicamente incorretas; o sumo mal encontra-se nos dados que precederiam à opção, quer sejam estes de caráter étnico, histórico, social, moral e inclusive sexual, e inclusive nos avatares humanos. O politicamente correto não atende à igualdade de oportunidade alguma no ponto de partida, senão, ao igualitarismo nos resultados no ponto de chegada.
- Quem o inventou?
- Ninguém inventou o politicamente correto: ele nasceu como conseqüência da decadência do espírito crítico da identidade coletiva, quer seja esta social, nacional, religiosa ou étnica.
- Quem o pratica?
- O politicamente correto é de uso comum entre os intelectuais desarraigados, porém como é contagioso, é normal que outras pessoas estejam contaminadas sem que por isso estejam conscientes disso.
- Como podemos nos desintoxicar?
- A desintoxicação é difícil, na medida em que vivemos em um mundo no qual os meios (e a palavra mídia é, em si mesma, um barbarismo politicamente correto) adquiriram uma importância desmesurada e são precisamente estes os encarregados do contágio massivo. O primeiro remédio consiste em tomar consciência de que o politicamente correto existe e que circula sobretudo através de nosso vocabulário. O segundo, seria tomar consciência de que o “eu” forma parte de um “nós” e de que este “nós” deve proteger o “eu” contra o “se diz...” politicamente correto. O terceiro remédio consiste em pôr em prática a consciência de renúncia à toda terminologia politicamente correta e às ideologias sobre às quais se apoia. Por exemplo, há que dizer “aborto” em lugar de “interrupção da gravidez”, “surdo” em lugar de “deficiente auditivo”, “velhice” em lugar de “terceira idade”, “sem-vergonha” em lugar de “inadaptado”. Um “docente” nunca chegará a ser um “mestre”.
- Quais são os estragos produzidos pelo “politicamente correto”?
- Consistem fundamentalmente em confundir o bem e o mal, sob o pretexto de que tudo é matéria opinativa.
- À parte a nação, quais são os alvos prediletos do “politicamente correto”?
- Os alvos prediletos são a família, as tradições e, sobretudo, a crença nisto, posto que para o politicamente correto só há uma verdade e o resto é falso.
- O senhor tem a impressão de que a França é um dos países mais atingidos pelo “politicamente correto”?
- O politicamente correto é supranacional como todas as enfermidades. Se estamos em condições de afirmar que nasceu em determinadas universidades americanas, não é menos certo que expandiu-se rapidamente por todo o mundo. Talvez nos países de tradição cristã-ortodoxa se resista mais e melhor a esta epidemia, provavelmente devido à propaganda comunista, talvez à própria fé religiosa. Vimos recentemente com os casos da Sérvia e da Rússia.
- Como detectar uma pessoa “politicamente correta”?
- Uma pessoa politicamente correta se considera a si mesma tolerante, porém não pratica a tolerância...
- Como evitar a contaminação?
- É verdade que o politicamente correto nos espreita e se apresenta sempre com argumentos inocentes e de fácil assimilação. Trata-se de rechaçar sua inocência e repudiar essa facilidade de assimilação. É necessário, do mesmo modo, prevenir-se contra o mimetismo de falar como os demais. Repito ainda o risco de parecer pesado, o vocabulário politicamente correto é o principal veículo de contágio. Em qualquer caso, há que afirmar que o politicamente correto é uma fé débil e que, como tal, não resiste a uma enérgica aplicação do espírito crítico. Não temos que ser submissos aos sentimentos e opiniões generalizadas: o espírito contraditório mais obtuso vale sempre mais do que a livre aceitação do pasto midiático.
- Segundo o sr., quais podem ser as conseqüências a curto e médio prazo do triunfo do “politicamente correto”?
- O politicamente correto prepara o terreno de forma ideal para as operações de desinformação e para a expansão da mundialização. Quando todo o mundo acreditar que as verdades podem ser objetos de truque, de que não existem nem verdades nem mentiras, o mundo estará preparado para receber a mesma propaganda, de participar da mesma pseudo-opinião pública fabricada para consumo universal. E esta pseudo-opinião pública aceitará qualquer ação, inclusive as mais brutais que indefectivelmente irão em benefício dos manipuladores.
- Obras de Vladimir Volkoff sobre a manipulação da informação: “Le montage”, “La désinformation, arme de guerre”, “Petite histoire de la désinformation”, “Désinformation, flagrant délit”, “Manuel du politiquement correct” e “La désinformation par l’image”.
(Publicado por harrymagazine.com)
Tradução: Graça Salgueiro